A decisão de se separar de fato – sair de casa, encerrar a convivência – é um marco doloroso. Para muitos, ela significa o início de uma nova fase, onde cada um cuida da sua própria vida e do seu próprio patrimônio. É comum, então, a pessoa se permitir uma nova compra: um carro, um imóvel, um investimento, pensando “agora sou solteiro(a), este é só meu”.
Mas e se eu te dissesse que, mesmo depois de dar “adeus” ao seu ex, um bem comprado com dinheiro antigo do casal ainda pode ter que ser dividido na partilha? Essa é uma armadilha legal em que muita gente cai, e que pode custar caro.
O erro está em confundir a separação de fato com a conclusão formal da partilha de bens. Vamos entender a lógica da lei e evitar que sua nova conquista se torne mais um motivo de briga no divórcio.
A PARTILHA AINDA NÃO ACABOU
É verdade que, a partir da data da separação de fato (o dia em que vocês efetivamente se separam e param de viver juntos), o que você ganha (seu salário, por exemplo) e o que você gasta (suas dívidas) passam a ser apenas seus. A comunhão de bens em relação a rendimentos futuros se encerra.
PORÉM, o patrimônio que foi acumulado ANTES da separação de fato – o dinheiro guardado na poupança, nos investimentos, o FGTS – continua sendo patrimônio do casal até que a partilha seja oficialmente concluída e homologada pela Justiça.
O CONCEITO DE SUB-ROGAÇÃO
É aqui que entra um conceito fundamental do Direito de Família, previsto, por exemplo, no Art. 1.659, I, do Código Civil, que trata da comunhão parcial de bens. Funciona assim:
Se você pega um dinheiro que era do casal (um “dinheiro velho”, adquirido durante o casamento) para comprar um bem novo (um carro, por exemplo), o que você fez foi apenas substituir um patrimônio por outro.
Você trocou o dinheiro que estava na conta (que era 50% de cada um) por um carro. Logo, esse carro herda a condição do dinheiro que o comprou. Se o dinheiro era do casal, o carro também será do casal.
A justiça vai rastrear a origem do dinheiro usado na compra. Não importa se a compra foi feita depois da separação de fato; se a fonte do recurso era um patrimônio comum ainda não partilhado, o bem novo entra na divisão.
RICARDO E ANA”: UM ALERTA
Como eu explico no vídeo, Ricardo e Ana se separaram em janeiro. Em fevereiro, antes de formalizar o divórcio, Ricardo usou R$ 100.000,00 de uma conta de investimentos (dinheiro guardado durante o casamento) para comprar a moto esportiva dos sonhos. No processo de partilha, ele alegou que a moto era só dele, pois comprou depois da separação.
O resultado? A advogada de Ana pediu os extratos bancários de Ricardo. Ficou provado que o dinheiro para a moto veio do investimento do casal. O juiz determinou que a moto, ou seu valor correspondente, era um bem do casal e deveria ser dividida. Os R$ 100.000,00 usados eram, na verdade, R$ 50.000,00 do Ricardo e R$ 50.000,00 da Ana.
A MENSAGEM FINAL
A lógica “o dinheiro estava na minha conta, o CPF é meu, e já não estávamos mais juntos, então é patrimônio particular” é uma falha fatal para a Justiça. A pergunta crucial não é apenas quando você comprou, mas com qual dinheiro você comprou.
Até que a partilha de bens esteja oficialmente assinada e homologada, o patrimônio acumulado durante o casamento continua sendo do casal. Evite fazer grandes movimentações, comprar ou vender bens ou usar recursos acumulados antes da formalização do divórcio. Transparência e paciência nesse período não são apenas virtudes; são estratégias essenciais para proteger seu futuro financeiro e evitar surpresas desagradáveis no processo.
Cada caso possui suas particularidades. Este post serve para informar e esclarecer, mas não substitui a orientação de uma advogada especialista em Direito de Família, que poderá analisar os detalhes da sua história e garantir a melhor proteção para seu patrimônio.


