Durante o casamento, é comum que um dos cônjuges decida abrir um negócio. A empresa cresce, gera lucros e se torna o principal patrimônio da família. Mas quando o divórcio bate à porta, uma dúvida angustiante surge para a outra parte: “A empresa está toda no nome dele. Eu, que apoiei, cuidei da casa e dos filhos para que ele pudesse se dedicar ao negócio, tenho algum direito a ela?”.
A resposta é um enfático sim.
Esqueça a ideia de que o CNPJ protege o patrimônio do casal. Para a Justiça, uma empresa fundada durante o casamento é um “fruto” daquela união, e os frutos, em uma sociedade conjugal, devem ser divididos. Vamos entender como a lei protege seu direito e garante sua parte no valor do negócio.
A Regra Principal: Bens se Comunicam, Empresas Também
No regime padrão da Comunhão Parcial de Bens, tudo o que é adquirido de forma onerosa (comprado ou construído com esforço) durante o casamento se “comunica”, ou seja, torna-se patrimônio comum do casal.
Empresa é um Bem: Uma empresa, com suas cotas sociais, lucros e valor de mercado, é considerada um bem como qualquer outro (um carro, um imóvel). Se ela foi constituída durante o casamento, ela entra na partilha.
O que é Dividido? É importante entender este ponto: você não se tornará “sócia” do seu ex-marido no CNPJ. O que você tem direito é à metade do valor econômico da participação dele na empresa.
Exemplo: Se a empresa vale R$ 500 mil e foi 100% constituída durante o casamento, você tem direito a R$ 250 mil na partilha.
“Mas Eu Nunca Trabalhei na Empresa”: A Importância da Contribuição Indireta
Este é o argumento mais comum usado para tentar excluir a empresa da divisão. E é exatamente aqui que a Justiça protege você.
O Esforço Comum Reconhecido: A lei e os tribunais reconhecem que o sucesso de um negócio não depende apenas de quem está no escritório. A sua contribuição, seja cuidando do lar, criando os filhos ou dando suporte emocional, foi a base que permitiu que seu ex-parceiro tivesse a tranquilidade e o tempo necessários para se dedicar e fazer a empresa prosperar.
Você é Sócia do Projeto de Vida: A Justiça entende o casamento como um projeto de vida em comum. Se a empresa foi um dos resultados desse projeto, você é “sócia” dele, mesmo que seu nome não apareça no contrato social.
Como o Valor da Empresa é Calculado na Prática?
Determinar o valor justo de uma empresa pode ser complexo. Por isso, o processo judicial tem uma ferramenta específica para isso.
A Perícia Contábil: Se não houver um acordo amigável sobre o valor, seu advogado pode pedir ao juiz que nomeie um perito contábil. Este especialista fará uma avaliação completa da empresa (chamada de “apuração de haveres”), analisando o faturamento, os lucros, os ativos e o valor de mercado para definir quanto ela realmente vale.
Garantia de Justiça: A perícia garante que o valor apresentado não seja manipulado ou subestimado, assegurando que sua metade seja calculada sobre o montante real e justo.
Um Caso Real para Ilustrar (Tribunal de Justiça do Paraná)
Como você mencionou no vídeo, casos assim são julgados todos os dias. Em uma decisão do TJPR, um médico constituiu duas empresas durante seu casamento. No divórcio, a ex-esposa, que nunca foi sócia no papel, teve seu direito reconhecido. O tribunal determinou que ela receberia metade do valor das cotas de ambas as empresas, pois elas foram criadas com o esforço comum do casal.
Conclusão
O nome no CNPJ não define quem é o verdadeiro dono do sucesso de um negócio familiar. A lei reconhece que por trás de um empreendedor de sucesso, muitas vezes há um parceiro(a) dando o suporte essencial que torna tudo possível.
Se uma empresa foi criada ou cresceu significativamente durante seu casamento, não aceite o argumento de que você não tem direito a ela. Você tem direito à metade do valor correspondente ao esforço do casal. Busque orientação jurídica para garantir que uma avaliação justa seja feita e que seu papel fundamental na construção desse patrimônio seja reconhecido e recompensado.
Cada caso possui suas particularidades. Este post serve para informar e esclarecer, mas não substitui a orientação de uma advogada especialista em Direito de Família, que poderá analisar os detalhes da sua história e garantir a melhor proteção para seus direitos.