É uma cena comum e desgastante: a cada mês, junto com o comprovante de pagamento (quando ele vem), surge a cobrança: “Quero ver os comprovantes de tudo que você gastou com a pensão”. Ou pior: “Para onde está indo o dinheiro que eu te dou?”.
Muitos pais, infelizmente, acreditam ter o direito de “auditar” cada centavo da pensão alimentícia, como se a mãe fosse uma funcionária que precisa justificar cada gasto. O que deveria ser o cumprimento de uma obrigação paterna se transforma em uma ferramenta de controle, assédio e intromissão na vida da mãe.
Mas a verdade é que, na grande maioria dos casos, a lei não exige que a mãe apresente um relatório detalhado de despesas. A pensão alimentícia é para o filho e deve ser administrada pela mãe, que é quem detém a guarda e o dia a dia da criança.
O VALOR DA PENSÃO É PARA O PADRÃO DE VIDA DO FILHO.
O valor da pensão alimentícia é fixado para custear o padrão de vida da criança. Isso inclui, sim, gastos visíveis como escola, comida, roupa. Mas também envolve uma infinidade de “gastos invisíveis”: o aluguel do imóvel, a conta de luz, água, internet, o transporte, o lazer, as despesas médicas não cobertas por plano, e a própria dedicação e tempo da mãe.
Não existe na lei a obrigação da mãe de enviar um relatório mensal de despesas ao pai. Uma vez pago, o valor da pensão deve ser administrado por quem detém a guarda, visando sempre o bem-estar do filho. A tentativa de controle sobre o gasto da pensão é, muitas vezes, uma forma de estender um poder indevido sobre a vida da ex-parceira.
QUANDO A JUSTIÇA PODE (EXCEPCIONALMENTE) PEDIR EM QUE A MAE GASTA O DINHEIRO DA PENSÃO ALIMENTÍCIA
A única situação em que a mãe pode ser obrigada a prestar contas é através de uma medida judicial excepcionalíssima chamada Ação de Exigir Contas ou Prestação de Contas. Mas para isso, não basta o “achismo” ou a “birra” do pai.
A jurisprudência, especialmente do Superior Tribunal de Justiça (STJ), exige requisitos muito claros e provas robustas de desvio de valores. Por exemplo:
A criança está visivelmente negligenciada: malvestida, com fome, sem acesso à escola ou saúde.
Enquanto a criança sofre, a mãe ostenta luxos incompatíveis com a renda e com o valor da pensão recebida.
Pensão de Baixo Valor: Se o pai paga R$ 400, R$ 500, R$ 600 de pensão e exige auditoria, o pedido dificilmente será aceito. Esse valor mal cobre as despesas básicas da criança. Uma ação de prestação de contas só faria sentido em casos de pensões de valores muito altos, onde um desvio poderia ocorrer sem que as necessidades básicas da criança fossem visivelmente afetadas.
A TENTATIVA DE CONTROLE
Como eu explico no vídeo, o ex-marido de Amanda, Pedro, pagava R$ 800,00 de pensão e todo mês exigia que ela preenchesse uma planilha de gastos, com ligações e áudios incessantes. Embora a criança fosse bem cuidada, a vida de Amanda era um inferno. Pedro entrou na justiça pedindo a prestação de contas.
A juíza, ao constatar que as necessidades da criança estavam supridas e que não havia nenhuma prova de desvio, indeferiu o pedido de Pedro. Ela o advertiu, deixando claro que a obrigação dele era pagar a pensão, não fiscalizar a vida da mãe. A tentativa de controle dele foi barrada pela justiça.
A BÚSSOLA JURÍDICA
A preocupação legítima com o bem-estar do filho se faz com convivência, participação ativa e carinho, e não com a cobrança de notinhas fiscais. Se a guarda do seu filho é sua, a administração da pensão também é sua responsabilidade, e a lei presume que você está fazendo o melhor para a criança.
A cobrança constante de comprovantes no dia a dia é abusiva e você não tem que se submeter a isso. Se o pai tem uma desconfiança legítima e PROVAS CONCRETAS de desvio, ele deve procurar a Justiça. Fora isso, a única mensagem que ele precisa te mandar sobre a pensão é o comprovante de pagamento no dia certo. Apenas isso.
Cada caso possui suas particularidades. Este post serve para informar e esclarecer, mas não substitui a orientação de uma advogada especialista em Direito de Família, que poderá te ajudar a lidar com situações de assédio e cobranças indevidas.


